estaleiroExemplo emblemático do nível dos executivos escolhidos para pilotar o projeto de transformar o Brasil numa potência mundial. A Folha de S.Paulo publicou notícia ontem (20) com a história da passagem de João Carlos Ferraz pela presidência da Sete Brasil. Em carta à empresa, ele admite ter recebido US$ 2 mi em propina dos estaleiros fornecedores da Sete Brasil nos últimos anos.

A Sete Brasil é uma empresa privada criada em 2010 para construir 28 sondas de perfuração que seriam alugadas à Petrobras. Tem como sócios BTG Pactual, Bradesco, Santander, fundos de pensão estatais, FI-FGTS e Petrobras. A ligação com a operação Lava Jato mergulhou a empresa numa crise, suspendendo encomendas de estaleiros.  Estes, em cadeia, alegando falta de pagamento, demitiram milhares de trabalhadores, do Nordeste ao Rio Grande do Sul.

A Sete Brasil surgiu no bojo do projeto ambicioso do governo petista de criar megacorporações para projetar o Brasil lá fora. Mesmo com auxílio bilionário do BNDES e de outros bancos, alguns desses projetos só deram lucro aos donos. Outros se transformaram em elefantes brancos, de que são exemplos negativos a Oi e o Grupo X, do ilusionista Eike Batista.

A história do CEO da Sete Brasil João Ferraz é emblemática. Ele ficou na empresa de dezembro 2010 a maio de 2014 e confessa na carta ter recebido propina em 2013 “num momento de fraqueza”, pressionado por colegas. Não diz quem. Na carta, promete devolver o dinheiro. Sua origem é a Petrobras, a mesma do colega na Sete Brasil, Pedro Barusco, o gerente que fez delação premiada e prometeu devolver cerca de US$ 90 milhões depositados no exterior.

Os estaleiros contratados pela Sete Brasil foram a fonte de abastecimento de propina não só dos dois, mas também do onipresente João Vaccari Neto, tesoureiro do PT, segundo a reportagem da Folha de S.Paulo. Os dois executivos da Sete Brasil tinham conta na Suíça, para onde ia o dinheiro. A comissão era matematicamente dividida, de 0,1% a 0,9% dos bilhões orçados pela construção das sondas.

“Os construtores navais foram obrigados a pagar subornos no valor de 0,9 % dos contratos com a Sete Brasil para um grupo que incluía o tesoureiro do PT , João Vaccari Neto, e diversos funcionários da Petrobras e da Sete Brasil”, disse Barusco em depoimento à PF.

Gestores de araque

A concepção da Sete Brasil e a passagem do executivo pela empresa são típicos exemplos de uma espécie de empresa-modelo e executivo gestados nos últimos anos no Brasil. Fosse apenas pela indicação do governo, não causaria muito espanto. Já que é o mesmo governo que cochilou ao manter durante anos na Petrobras e na Transpetro executivos responsáveis pelo maior saque já realizado numa empresa pública de que se tem notícia na história do Brasil.

Mas este caso surpreende e até certo ponto choca, porque a empresa tem como sócios vários bancos privados que, convenhamos, não costumam rasgar dinheiro. São empresas preocupadas com imagem e onde a ética, pelo menos na missão estampada nos quadros das paredes e sites, é apregoada como um dos valores a serem cultivados.

Não é de admirar na composição acionária ter fundos de pensão das estatais. Apesar de entidades privadas, construídas com patrimônio dos empregados, são usados pelos governos de plantão para fazer política, chamados para participar de projetos muitas vezes duvidosos, quando não deficitários, e muitas vezes até mesmo para servir a interesses privados de diretores indicados politicamente.

Outro acionista é a Petrobras que, certamente, não tinha muita autonomia na empresa. Se tinha alguma função de comando, foi engolfada pelo mesmo esquema de corrupção que acabou contaminando pelo menos quatro de suas diretorias, fatos apurados agora pela operação Lava Jato. Em resumo, uma megaempresa é montada para comandar negócios da ordem de RS$ 22 bilhões (faturamento de muito poucas empresas no mundo) e escolhe-se para comandá-la alguém que tem “momentos de fraqueza”.

Pasmem agora. Esse cidadão que ficou três anos e meio na Sete Brasil, acusado de desvios, quando foi demitido, porque os acionistas não estavam satisfeitos com o seu desempenho, acabou levando R$ 11,5 milhões de bonificação. Ele queria o dobro disso.

A Sete Brasil anunciou ontem que entrou com ação na Justiça para reaver R$ 22 milhões do ex-presidente. Esses valores se referem a bonificações recebidas durante o período que permaneceu no cargo e a propinas que recebeu de estaleiros contratados para construir sondas para o pré-sal.

Não fosse pelos milhões recebidos como propina, pelo esquema montado e, sabe-se lá, até pela constituição dessa megaempresa, a passagem desse cidadão pela Sete Brasil, em conluio com o ex-gerente e colega, deixou um rastro de crise, de mais de 20 mil demissões pelo Brasil.

Triste legado para quem nos “Valores” publicados no site apregoa “A Sete Brasil gera empregos e riquezas no país...” A Sete Brasil estaria devendo aos estaleiros cerca de R$ 1,5 bilhão. Fundações e bancos teriam perdas de R$ 2,5 bilhões com a crise da empresa.

Pode-se perguntar, e o que fazia lá o Conselho de Administração com representantes das empresas privadas, além dos fundos de pensão e Petrobras, que não descobriram que o CEO da empresa recebia propina? Em maio deste ano, o diretor de Operações e Participações da Sete Brasil foi à CPI da Petrobras e afirmou que a divulgação do esquema de corrupção na Petrobras causou “surpresa” na sua empresa. "A Sete está nessa situação em decorrência da Lava Jato, que retraiu o mercado financeiro", disse.

Com os ventos contrários, alguns acionistas, como Petroserv e OAS/Etesco teriam saído do negócio. As duas companhias tinham participação em cinco sondas e a Sete Brasil procura, agora, interessados na operação, conforme especulação da imprensa.

Relações nebulosas

Na auditoria interna feita pela nova direção da Sete Brasil, nada foi encontrado de irregularidades na gestão de Ferraz e de Pedro Barusco, que foi diretor também da companhia, depois de sair da Petrobras, onde foi gerente e réu confesso de receber propinas no caso da Operação Lava-Jato, segundo informa a imprensa nesta semana. Só não se entende por que a empresa quer que o ex-CEO devolva R$ 22 milhões.

O executivo que confessa “um momento de fraqueza” foi indicado para comandar um projeto megalômano de construir 28 sondas, orçadas em US$ 22 bilhões. Passados quatro anos, o que se vê hoje é uma empresa com futuro bastante incerto. Denunciada na Lava Jato, não pode receber US$ 9 bilhões de financiamento do BNDES. E isso obrigou os sócios e credores a injetar dinheiro para salvá-la.

Segundo o colunista Lauro Jardim, de Veja, “com o prazo concedido pelos bancos para se reorganizar, a Sete Brasil ganhou tempo, mas ainda não saiu das cordas. Nenhuma das duas alternativas de salvação para a empresa, criada com o único objetivo de fornecer sondas para o pré-sal, é animadora. Na primeira, já rejeitada por quase todos os credores, os bancos dão a Sete por perdida e vão buscar ressarcimento no fundo garantidor do setor. O problema é que os recursos disponíveis para eles no fundo chegam apenas a 35% ou 40% do total emprestado pelos bancos à companhia.
A segunda solução — até agora mais provável– é aceitar que a Sete vai encolher significativamente e ainda assim fazer novos aportes financeiros, na tentativa de recuperar um pouco mais de dinheiro.

Segundo o jornal O Estado de S.Paulo, “além da dificuldade de financiar a construção das sondas, a Sete Brasil sofre as consequências  do corte de investimentos da Petrobas, única cliente da fornecedora. A estatal pode cortar entre R$ 20 a 30 bilhões de investimentos previstos para este ano. Investigações policiais e interferências políticas à parte, uma conjunção de outros fatores atingiram a Petrobras e a Sete. Os principais são a queda de 45% no preço internacional do petróleo em um ano e a forte concorrência da produção de petróleo de gás xisto pelos EUA, com custo de produção bem inferior ao do pré-sal.

De tudo o que se disse, talvez o mais curioso dessa história seja a menção feita por João Ferraz, na carta enviada à Sete Brasil, afirmando que em 2012 “passou a receber avisos em tom intimidatório de que seria mais seguro para ele aceitar” as propinas oferecidas. Seria mais vantajoso para todos envolvê-lo na operação, “de modo a blindá-lo. O que faz alguém que deseja preservar sua reputação e colaborar para que falcatruas não sejam cometidas na empresa e no país? Denuncia.
Faltou essa explicação na carta do Sr. Ferraz. Por que imediatamente não se demitiu, convocou a imprensa e divulgou o esquema? Talvez com uma denúncia, lá em 2013, além de ter colaborado para evitar o que acontece hoje na empresa, ele tivesse precipitado a Operação Lava Jato, fechando os dutos da corrupção um ano antes. Perdeu a chance de entrar na história pela porta certa.

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