papa e jovensQue a Igreja Católica vem enfrentando uma crise nos últimos anos, ninguém tem dúvida. Que a reputação da Igreja é muito forte, também é verdade. E como fazer para reverter essa crise? Quebra-se um tabu, com a renúncia de um Papa pela primeira vez em 700 anos. E elege-se uma figura carismática, pouco afeito a ostentações, badalações e riquezas. E o resultado aparece em oito meses.

É mais ou menos o que está acontecendo com a Igreja Católica, no comando do jesuíta Papa Francisco, pouco citado nas apostas dos vaticanistas, quando do conclave que escolheu o Papa em março último. Uma “zebra” que acabou servindo como uma luva para o atual momento da Igreja.

Segundo reportagem do jornal Sunday Times, de Londres, neste domingo (17), o Papa inspirou uma onda de atendimentos e confissões na Igreja Católica, revertendo décadas de declínio.  “Nos oito meses desde que foi escolhido, as igrejas católicas na Grã-Bretanha têm visto um aumento de cerca de 20% nas congregações, atraindo novos e faltosos membros.”

Segundo a reportagem de George Arbuthnott and Luke Garratt,  mais da metade dos sacerdotes pesquisados na Itália, confirmam também  um aumento no apoio de diversos segmentos católicos e não católicos para a Igreja. Na Espanha, a Igreja conseguiu estancar uma década de crise no atendimento aos fiéis, mesmo num país refém de uma das maiores crises econômicas da história recente.

Líderes católicos nos EUA, França e América Latina relatam também crescimento no número de fiéis. Na Argentina, país de origem do Papa, mais 12% da população, agora, se definem como religiosos, em relação ao período anterior à sua eleição.

Segundo a reportagem do Sunday Times, “os resultados sugerem que o apelo "eletrizante" do Papa Francisco dá um sopro de vida nova a uma igreja seriamente afetada pelos escândalos de padres pedófilos em série, que se intensificaram nos anos 2000.  “O mundo já entendeu que ele está falando agora sobre a criação de tribunais da igreja em todo o mundo, para lidar com padres pedófilos com maior rapidez e severidade. O que não aconteceu no passado.”

Não há dúvidas de que o exemplo de uma vida austera tem ajudado nessa conquista, diz a reportagem. “O Papa Francisco tem dispensado o motorista para viajar de ônibus, carrega sua própria mala e se recusa a ficar nos apartamentos papais de luxo. Houve atos humildes, nunca vistos em um Papa os tempos modernos, como viver em um albergue, lavando os pés dos prisioneiros do sexo feminino e abraçando um homem em condição grotescamente desfigurante pela neurofibromatose, doença rara conhecida como a síndrome do “Homem Elefante”.

A Igreja parece também ter adotado com mais amplitude políticas que mudam radicalmente a visão anterior sobre acontecimentos atuais, como o fato de o Papa anunciar publicamente que não vai julgar as pessoas por serem gays, além das reformas na burocracia do Vaticano, tão criticada e a quem se atribui o desgosto e a renúncia de Bento XVI, além de consulta a católicos comuns sobre temas polêmicos, incluindo a contracepção e o sexo antes do casamento.

No Reino Unido, país onde a religião oficial é a Anglicana, resultado de um cisma com a Igreja Católica há cinco séculos, onde a própria mídia tem certa reserva a temas católicos, o arcebispo Vincent Nichols, líder da Igreja Católica na Inglaterra e no País de Gales, elogiou o "efeito Francisco".

Ele disse que "o amor de Deus" brilhou "através das palavras e ações do Papa Francisco". Esta semana, o jornal “Catholic Herald” convocou os sacerdotes na Grã-Bretanha para copiar o estilo do Papa. O editor, Luke Coppen, disse que o Papa Francisco produziu um efeito "eletrizante" na católicos no Reino Unido.

Pesquisa realizada pelo jornal Sunday Times, em 22 paróquias católicas na Inglaterra e no País de Gales, das 13 que responderam os questionamentos, 11 reportaram um aumento de católicos. Nas nove igrejas que forneceram números, 11.461 pessoas participaram em outubro do ano passado de cultos e cerimônias, contra 13.862 este ano - um aumento de 21%. Em algumas cidades, o crescimento foi de 35%.

Corrida ao Vaticano

A reportagem do Sunday Times diz também que as audiências no endereço semanal do Papa subiram para 85 mil no mês passado, contra 5 mil de seu antecessor, Bento XVI. Naturalmente, isso tem muito a ver com o perfil do Papa, de um teólogo tímido e reservado, com aquela fleuma saxônica, para um Cardeal latino, popular, que andava de ônibus em Buenos Aires e visitava a periferia de bairros pobres. Em função dessa demanda, as audiências tiveram que ser transferidas para a Praça de São Pedro para acomodar a quantidade de fiéis.

As cinco diferenças de Francisco

Em outro artigo, publicado na revista The Week esta semana, Peter Weber* diz que o Papa Francisco induziu à conversão em todo o mundo. “Sua humildade visível, a bondade, a vontade de se envolver com os críticos e admiradores, da mesma forma, a aparente falta de inibições verbais, e a relaxada ortodoxia doutrinal fazem uma grande mudança de estilo em relação aos seus dois antecessores e aos 25 anos de papado de João Paulo II e Bento XVI. Nem todo mundo é fã de Francisco, mas a resposta tem sido, mesmo assim, em grande parte, entusiasmada e positiva”.

Na reportagem, Peter Weber elegeu cinco argumentos para explicar por que o papado de Francisco está abalando a tradição da Igreja Católica e o impacto provocado no mundo pelo chamado  "efeito Francisco."

1.    O Papa está preenchendo o vazio da Igreja

O Papa está encantando os não-católicos, e até mesmo alguns ateus, mas na segunda-feira (11), o Centro para o Estudo das Novas Religiões (Censur) mostrou que ele é bastante popular entre os católicos também. O sociólogo do Censur, Massimo Introvigne, descobriu que depois que Francisco foi eleito papa em março, mais da metade dos 250 sacerdotes na Itália, entrevistados por ele, relataram um aumento significativo no número de atendimento com católicos desiludidos, que começaram a voltar em massa para a Igreja.

2. Francisco está usando tesouras de poda para a burocracia do Vaticano

“A Cúria Romana, ou o tribunal papal no Vaticano, é a burocracia de um burocrata, a ossificação e o legendário poder entrincheirado. O Papa - o primeiro papa não-europeu em séculos - está tomando medidas para reduzir seu alcance e limpando a casa. Primeiro, ele exigiu transparência no super-secreto banco do Vaticano, o denominado Instituto para as Obras Religiosas. Ele também está falando de descentralização do poder para as conferências episcopais nacionais. "O tribunal é a lepra do papado", disse o papa ao jornal italiano La Repubblica, em setembro.”

3. Até mesmo o nome Francisco está realizando um retorno

Desde março, Francisco tornou-se o nome do bebê mais popular na Itália, de acordo com Enzo Caffarelli, da Universidade Tor Vergata de Roma. Será que realmente é o Papa que  está fazendo isso? Sim, diz Caffarelli. "O nome 'Francisco' é o nome mais popular para os recém-nascidos na Itália, até agora em 2013, e é evidente que o impacto do ex-José Mario Bergoglio é o principal fator que contribuiu para a popularidade do novo nome."

4. O Papa Francis está mudando a hierarquia católica da América

A Conferência dos Bispos Católicos dos EUA (USCCB) se realiza em Balitmore esta semana para escolher um novo líder para os próximos três anos. E "os mais de 200 prelados também estarão olhando por cima de suas cabeças - e talvez os seus ombros - para o Vaticano para avaliar o que a dramática nova abordagem do Papa 'significa' para o seu futuro", disse David Gibson na revista Religion News Service.

5. Ele escreve cartas e atende as pessoas ao telefone pessoalmente

O Papa Francisco é famoso por inesperadamente chamar as pessoas para oferecer seu apoio, ou condolências, ou até mesmo marcar uma entrevista. Veja como Eugenio Scalfari, ex-editor da italiana La Repubblica (e ateu), relembra sua primeira interação com o papa, por meio do telefone, segundo Peter  Weber:

“Eu respondi, e ele simplesmente disse: "Bom dia, é o Papa Francisco. Você me escreveu uma carta em que você disse que gostaria de me encontrar  e conhecer-me, por isso estou aqui. Vamos marcar uma entrevista. Terça-feira está OK para você? O tempo é o problema, 3 horas p.m. está OK? ... Em 60 anos de carreira como jornalista, entrevistei muitas pessoas importantes, e fiz amizade com alguns deles. Mas eu nunca pensei que poderia sentir, eu poderia tornar-se um amigo de um papa.”  As declarações de Scalfari foram feitas à NBC News.

Peter Weber é editor senior da TheWeek.co. Graduado pela Northwestern University, Peter trabalhou para as revistas Facts on File and The New York Times Magazine.

Leia as resportagens completas

The Week: The 'Francis effect': 5 ways the pope is resuscitating the Catholic Church

Sunday Times: ‘Francis effect’ pulls crowds back to church

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