corolla_4O mundo corporativo está preocupado. Todos conhecem a força da marca Toyota. Construída ao longo dos anos, simboliza um conceito elevado na indústria  automobilística. A empresa japonesa fabrica carros de alto nível de qualidade e segurança e desde o ano passado, apesar de se tornar a maior montadora do mundo, enredou-se num prosaico travamento do acelerador de alguns modelos americanos.

O imbróglio do acelerador jogou a Toyota numa das maiores crises de imagem da sua história. Problemas no pedal de aceleração de carros fabricados nos Estados Unidos obrigaram a montadora a fazer recall de 2,3 milhões de carros. O pedal do acelerador pode ficar preso e acelerar involuntariamente o veículo, causando acidentes graves.  Esse recall incluiu Lexus e Camry, os sedãs mais vendidos nos EUA.  Pressionada pelo mercado e pelas evidências, no fim de janeiro, a empresa estendeu o recall para Europa e China. A Toyota do Brasil informa que a campanha não atinge o mercado brasileiro. Os modelos indicados não são fabricados no Brasil, nem importados dos EUA.

O problema com o acelerador não é recente. No ano passado, a montadora já tinha anunciado o recall de 4,2 milhões de carros, o maior de sua história. Na ocasião, ela sugeriu a retirada dos tapetes que estavam emperrando o acelerador. Uma gambiarra que se mostrou desastrosa para o conceito da marca.

Embora a montadora alegue que não houve, até agora, comprovação de acidentes fatais por causa do problema, autoridades americanas colocam sob suspeição  vários acidentes ocorridos nos últimos meses. Um deles aconteceu em agosto de 2009.  Em San Diego (Califórnia), um Lexus, a 190 km/h saiu da pista, capotou e explodiu, causando a morte de uma família de quatro pessoas. Clarence M. Ditlow, diretor executivo do Centro para Segurança Automobilística de Washington, disse ao New York Times: foi apreendida uma gravação das mortes das quatro pessoas numa incontrolável aceleração, onde o motorista era um experiente policial da patrulha rodoviária. Se ele não pôde manter o carro sob controle, quem poderia?

Em razão disso, a empresa decidiu não só fazer recall, como suspender a produção e comercialização de oito modelos, todos fabricados nos EUA e Canadá. Eles representam 57% das vendas totais da montadora em 2009, no mercado americano. Um tremendo arranhão na imagem das marcas desses veículos e, principalmente, na da própria montadora.

Imagem arranhada

O presidente do Automotive Consulting Group, Dennis Virag, afirmou que “o que aconteceu é um golpe devastador na reputação da Toyota”. Jake Fischer, engenheiro automotivo, disse ao NYT, que esta é a mais séria crise que a Toyota enfrenta em meio século nos Estados Unidos. “Ocorreram alguns arranhões na blindagem da empresa, mas eu nunca tinha visto nada dessa magnitude. Eu nunca vi uma crise em múltiplas linhas de produção. Se você quiser escolher um Toyota agora, eles simplesmente não podem vender a você um Camry, eles não podem vender um Corolla ou uma Highlander”, disse.

As ações da Toyota caíram 15% desde que o problema começou e a agência de risco de crédito Fitch Rating, que classificava a empresa com um A+, a  colocou com viés negativo, ou seja, poderá rapidamente ter seu rating reduzido. Um concorrente da empresa disse que não se lembraria de um problema similar atingindo a indústria automobilística. “Todos fazem recalls em algum momento, mas eu não consigo me lembrar de um tão grande como este. Logicamente deve ser um autêntico pesadelo”, disse.

Com o envolvimento do Comitê Doméstico de Comércio e Energia, a Toyota enfrenta a mais divulgada investigação ocorrida na indústria de carros, desde os problemas com os pneus Firestone na Ford Explorer e outro veículos, ocorrida uma década atrás. Interpelada pelo Comitê, a Toyota terá que dar explicações desde quando detectou o problema e que providências tomou.  Para as autoridades e vários analistas, a Toyota subestimou a severidade da súbita aceleração dos carros, desde o ano passado,e não conduziu o problema com transparência, só acordando quando a situação se tornou caótica. Esse seu grande erro.

Marta Voss, porta-voz da empresa, disse ao NYT que “Ajudar a buscar a segurança de nossos clientes e restaurar a confiança na Toyota é o mais importante para nossa empresa”. O CEO da empresa, Akyo Toyoda, disse no Fórum Econômico em Davos (Suíça) que ós estamos extremamente sentidos por termos feito os clientes passar por esse desconforto.

O desgaste da Toyota é mais emblemático, porque atinge uma empresa que tinha verdadeiros fiéis compradores da marca. Nas últimas décadas ela se tornou a maior montadora do mundo, ultrapassando a GM, e a segunda dos EUA, devido à lealdade dos clientes. A imagem também cresceu na comunidade de negócios pela sua filosofia de administração, que desenvolveu um sistema de produção que dava grande autonomia para a linha de montagem, desde que fosse para resolver os problemas.

Quanto às perdas financeiras, analistas dizem que depende de quanto tempo as fábricas ficarão paradas. Mas poderia custar cerca de US$ 550 milhões por mês.

A grande questão que se coloca no mercado agora é como a montadora vai reconstruir sua imagem, que já sofre desgaste desde o ano passado. A questão é ela demonstrar que realmente tem compromisso com os seus clientes. Ou apenas está fazendo isso para cumprir determinações legais? John Paul Mac Duffie, professor de administração da Wharton School, da Universidade da Pennsylvania, disse que “a reação do público ao recall demonstrou que a Toyota tinha que ter maior empenho para resolver o problema. Reputações levam um longo tempo para serem construídas e elas podem ser destruídas rapidamente. Nesse momento, está tudo muito caótico e parece muito mal”.

Ativo intangível

Não há dúvidas de que os resultados financeiros são muito importantes para uma organização. Elas até podem figurar no ranking da Forbes, por volume de faturamento. Mas por que as empresas deveriam se preocupar com imagem e reputação? De acordo com um estudo feito nas últimas duas décadas por Charles Fombrun (autor dos livros  Reputation e Fame and Fortune) e outros especialistas, os ativos intangíveis tais como a reputação podem ser responsáveis por vantagens competitivas mais fortes do que patentes, design e inovação, marketing ousado e novas tecnologias.

O autor mostra evidências de como a reputação pode ter um impacto positivo no crescimento versus perdas na margem do lucro, moral dos empregados, aceitação da comunidade, suporte nos investimentos, relacionamentos com vendedores e fornecedores e no orgulho organizacional como um todo. Ele chama isto de “capital reputacional”.

É esse ativo intangível ou esse “capital” que está começando a se corroer na Toyota. Por causa de erros que aconteceram no ano passado, quando os primeiros problemas surgiram no acelerador dos carros e, talvez, tenham sido minimizados. Ou, pior, mal avaliados.  Charles Fombrun afirma também no mesmo livro Reputation que as empresas desenvolvem reputações vencedoras tanto pela criatividade quanto em projetar habilidades que os seus consumidores reconhecem como únicas. O que certamente é o caso da Toyota.

Os estudos de Fombrun e outros autores sobre os ativos intangíveis mostram que as empresas mais respeitadas constroem suas reputações pelo desenvolvimento de práticas que integraram considerações econômicas e sociais com a estratégia competitiva. “Eles não só fazem certas coisas”, diz Fombrun, “eles fazem coisas certas”. Seu nome torna-se um ativo valioso.

É isso que a Toyota está correndo sério risco de deteriorar. Os próximos passos da empresa é que vão determinar se ela terá capacidade de superar a mais séria crise de sua história, depois de no passado ter tido a coragem de dar um salto de qualidade, quando o Japão se tornou modelo de administração para o Ocidente. A ameaça é séria. Menos do que o prejuízo financeiro, que será muito pesado, o que está em jogo atualmente é a imagem da Toyota, um capital que ela levou décadas para consolidar.

Foto: Tannen Maury/EPA

Comentários

Crise se agrava e mídia não perdoa Toyota

A Revista Time publicou reportagem, analisando os motivos que levaram a Toyota a mergulhar numa crise, justamente no ano em que se tornou a maior montadora do mundo. Talvez por isso mesmo e paradoxalmente, ao perseguir o primeiro lugar, ela esqueceu o bordão que lhe valeu a liderança: a segurança e a qualidade dos carros em primeiro lugar.

Na Inglaterra, foi anunciado em 4 de fevereiro pelo jornal The Times que a montadora suspendeu a entrega de novos carros,  e anunciou o recall de 180 mil veículos que poderiam estar afetados pelo problema no pedal. O defeito, que foi primeiro denunciado nos Estados Unidos, começa a ter um efeito cascata em todo o mundo.

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