Gilmar-JoaquimA recente discussão entre o presidente do STF e o ministro Joaquim Barbosa não teria tanta repercussão, se tivesse acontecido há 20 anos, quando a mídia eletrônica era incipiente. O poder de disseminação das imagens por meio da TV e dos sites eletrônicos maximizou o acalorado confronto. A ponto de as torcidas e até a mídia se dividirem a favor do presidente do STF ou do ministro Joaquim Barbosa.



Torcidas à parte, o lamentável bate-boca de autoridades, transmitido ao vivo ou reproduzido nos principais sites do país, arranha não apenas a imagem daquela Corte suprema, mas a reputação pessoal dos dois ministros. A sociedade supõe que os membros dos tribunais superiores são pessoas equilibradas. Mesmo em situações difíceis, elas manteriam a tranquilidade. Até porque todos os casos que acabam no Supremo são complexos e controversos. Existem divergências de interpretação. Caso contrário, teriam sido resolvidos em instâncias menores.

O destempero verbal de ambos os ministros não contribui para melhorar a imagem do Judiciário, já desgastado com a fama de ser lento na solução das causas que aos milhares chegam aos tribunais todos os dias. No momento em que a imagem do Legislativo está extremamente desgastada pelo escândalo das passagens, verbas indenizatórias e até contratação de domésticas, não convém ao país que o Judiciário se mostre fragilizado em desavenças públicas de seus membros.  É bom lembrar que o STF recentemente também foi criticado por ter concedido duas vezes habeas corpus ao banqueiro Daniel Dantas, questionado até por membros do próprio Judiciário. Ou seja, a exemplo do que não se recomenda ao juiz de futebol, o STF é um juiz que está aparecendo muito no jogo, ao contrário da postura discreta de alguns anos atrás.

O ministro Gilmar Mendes apressou-se em dizer à imprensa no dia seguinte ao entrevero da Corte, que “Não há crise, não há arranhão. O tribunal tem trabalhado muito bem”. Admita-se até que tenha trabalhado bem, mas o que se viu ao vivo nas imagens pelo menos é um prenúncio de crise. Pode ser mascarada, amenizada ou até resolvida, dependendo do comportamento dos dois ministros e dos demais membros daqui pra frente. Dizer que não há crise, não ajuda a solução do problema. Só faltou o ministro dizer que aquilo foi uma “marolinha”, a exemplo do presidente Lula, quando não dimensionou a extensão da crise econômica que se avizinhava. Pode não haver uma crise institucional no STF, mas os ingredientes da crise foram postos no ar. Depende de como vão ser temperados por Suas Excelências.

O destempero verbal queima carreiras políticas

Quem não se lembra da famosa frase do Deputado Paulo Maluf sobre estupro, pronunciada anos atrás num cochilo verbal do qual ele deve se arrepender até hoje. O ex-ministro Rubens Ricupero também foi vítima de comentários discutíveis do ponto de vista ético, em microfone aberto da TV Globo, quando era ministro da Fazenda, no Governo Itamar. Pego dizendo que aquilo que é bom, a gente mostra, e o que é ruim a gente esconde, no estúdio onde estava gravando uma entrevista com o jornalista Carlos Monforte,  acabou desfenestrado do governo e foi para o exterior cuidar de temas mais amenos.

Mais recentemente, a ex-ministra Marta Suplicy, em pleno apagão aéreo, soltou para os passageiros o mote “Relaxe e goze”, num lamentável escorregão verbal que respingou até mesmo na campanha para prefeita de São Paulo. Mas tudo isso não serviu para os políticos e outras autoridades públicas se precaverem. O deputado e ex-ministro Ciro Gomes, bem colocado nas pesquisas presidenciais, tido como político experiente e competente, cometeu um pecado mortal para quem pretende se lançar numa campanha política. Ofendeu com palavrões a imprensa, o Ministério Público e os próprios colegas do Congresso, a quem chamou “babacas”. Na afirmação destemperada, ainda desafiou: “Não tenho medo de ninguém. Da imprensa, de deputados”.

O desequilíbrio do ex-ministro decorreu da série de matérias que acusa deputados, inclusive ele, de ter usado passagens da cota do Congresso para viagens de parentes. Ele não favoreceu a sogra, como seu irmão governador do Ceará, alguns meses atrás. Mas teria beneficiado sua mãe “octogenária”, que deveria ser respeitada, segundo o deputado.

Nada justifica o destempero de Ciro Gomes. Nem a idade da mãe. Se a informação publicada não é verdadeira, cabe ao Ministro ir à imprensa ou mandar sua assessoria desmentir com os dados corretos. A irritação e o destempero verbal, que certamente serão usados contra ele na campanha, não contribui nem para esclarecer a denúncia, nem para melhorar a imagem dele próprio e do Congresso. Pelo contrário.

Reações desse tipo, a exemplo de outros deputados, como Silvio Costa e Alberto Fraga, flagrados utilizando verba pública para interesses privados, só pioram a imagem dos parlamentares e do Congresso Nacional. Situações críticas como essas, em que a autoridade se vê envolvida em denúncias graves, têm que ser resolvidas com transparência, educação e respeito à opinião pública e não com ataques destemperados à imprensa, como se esta fosse culpada do mau uso dos recursos públicos. No caso de Ciro, já não bastassem outros destemperos da campanha passada, agora os adversários políticos já têm munição suficiente para perguntar: alguém com pavio tão curto, estaria preparado para governar o país?

Com diz Carlos Eduardo Lins da Silva, Ombudsman da Folha de S. Paulo, “A sociedade tem o direito de saber com detalhes o que as autoridades públicas fazem com o seu dinheiro e de exigir punição para quem extrapola. O jornalismo tem o dever de apurar tudo que houver de irregular e de expor à execração nacional todos os que abusaram da confiança coletiva”.

O diretor da Transparência, Brasil, Cláudio Abramo, chama esses congressistas de amontoado de aventureiros, em entrevista ao jornal Correio Braziliense.

A sociedade, ao dar um mandato eletivo ao parlamentar, não lhe dá o direito de se locupletar às custas do erário. No caso das passagens e outros benefícios, pode até se admitir que a regulamentação seja falha, mas nem tudo que é permitido legalmente, é ético. Aliás, diante da desfaçatez das desculpas dos políticos e seus assessores, estes são valores cada vez mais escassos no múnus público. Até porque essas marolas de moralização do Congresso são cíclicas. Eles não se assustam com a crise. É apenas uma questão de tempo. Assim como a imprensa, que desconheceu por tanto tempo o que estava ocorrendo no Senado, com diretores demais e matérias de menos, eles apostam na memória fraca do eleitor brasileiro.

Acerto do Planalto ao comunicar doença da Ministra

Não é a primeira vez que autoridades públicas descobrem doenças enquanto estão no poder. Como bem lembrou Elio Gaspari, existem os maus exemplos, como o da doença do presidente Costa e Silva, em 1969, que foi escondida ou mal informada à imprensa e ao povo brasileiro.  Tancredo Neves escondeu sua doença às vésperas da posse, com medo da reação dos militares que entregavam o poder, após 20 anos.  Anos depois, Mário Covas foi extremamente transparente quando foi acometido de câncer. E neste governo, o vice-presidente, José Alencar também nunca escondeu a doença e o tratamento por que passa.

O furo da Folha de S. Paulo sobre a doença da ministra-chefe da Casa Civil pode ter precipitado o comunicado, mas não tira os méritos da estratégia do Palácio do Planalto para rapidamente neutralizar qualquer tipo de boato e evitar especulações. A própria ministra Dilma Roussef concordou em dar entrevista e, com transparência, ela e os médicos abriram o jogo de uma doença e um tratamento que, por ser a virtual candidata a presidência da República, não diz respeito somente a ela. Interessa à opinião pública. Entre o comunicado ao presidente Lula e a entrevista, não se passaram 24 horas.

Nessa caso, seguiu-se corretamente requisitos básicos da gestão de crise: rapidez em dar a notícia; transparência,  iniciativa das ações, controlando o discurso antes que a mídia avançasse na cobertura,  clareza e respeito à imprensa e à sociedade. Por isso, independentemente do que possa ocorrer na sucessão do presidente, a doença por si mesmo não é uma crise institucional que o governo ou a ministra estejam enfrentando. A forma como o caso foi tratado, acabou minimizando uma notícia que tinha tudo para causar um impacto bem maior.

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