ubsRombo bilionário no UBS e assalto a cofres de aluguel no Itaú expõem fragilidades de controle em empresas que deveriam dar aulas de segurança. São crises corporativas, com origem em episódios bizarros, que ameaçam a reputação de organizações poderosas no Brasil e no exterior.

Por que empresas com marcas fortes e presença internacional se deixam envolver em crises facilmente evitáveis?

Não adiantam belas campanhas institucionais, se em alguns momentos empresas, como o poderoso banco suíço UBS, não conseguem explicar aos acionistas como um simples operador na Inglaterra pode dar um rombo de US$ 2,3 bilhões nas contas da empresa.

No caso do banco Itaú, a marca de maior valor do Brasil, o assalto aos 138 cofres de uma agência na Avenida Paulista, em S. Paulo, expôs a fragilidade da segurança e uma relação complicada com a polícia, criando uma outra crise na área policial. Ou seja, um banco global enrolado com uma crise paroquial.

UBS paga por falha na gestão de riscos

O tradicional banco suíço UBS descobriu na madrugada de sexta-feira (15) um rombo de US$ 2 bilhões em negócios não autorizados, em aplicações no mercado de derivativos, feitos por um operador situado em Londres.

Kweku_Adoboli_operador_do_UBSNo comunicado distribuído na sexta-feira (16), o UBS admite falhas nos controles. Não percebeu a fraude, apesar de os números figurarem no ”índex future” da Standard & Poor’s 500 e no da bolsa de Frankfurt. O empregado implicado no crime foi preso, em Londres, duas horas após o UBS ter descoberto a fraude. Uma corte de Londres indiciou Kweku M. Adoboli, de 31 anos, nascido no Gana e formado na Inglaterra.

Segundo um Comunicado distribuído pelo banco, “a verdadeira magnitude da exposição ao risco estava distorcida porque as posições tinham sido compensadas ​​nos nossos sistemas com dados fictícios, supostamente executados pelo funcionário”. O banco admite a falha: "Esses negócios fictícios escondiam o fato de que o índice futuro dos trades violaram os limites de risco do UBS". O empregado, na verdade, apostou em mercados futuros, para obter ganho pessoal, que acabou não se realizando.

O próprio banco admitiu perdas superiores aos US$ 2 bilhões anunciados. Deverão chegar a RS$ 2,3 bilhões. O UBS fez questão de informar que nenhuma posição de cliente foi afetada e que havia coberto as posições. Os negócios com “equities” estavam operando normalmente na segunda-feira, dentro dos limites de risco previamente definidos.

O UBS alertou os acionistas sobre o possível registro de prejuízo no trimestre, em função desse desvio. As agências de risco notificaram o UBS de que as falhas no gerenciamento de riscos podem levar à redução dos ratings do banco. A notícia voltou a levantar dúvidas sobre a eficácia dos sistemas de gestão de risco e controle de risco do UBS, reformulados nos últimos três anos depois de o banco ter dado baixa em US$ 50 bilhões em operações com valores mobiliários. Desde então, autoridades suíças vêm monitorando de perto o banco, com especial atenção para a reformulação dos sistemas gestão de risco.

No momento em que o sistema bancário na Europa atravessa período difícil, analistas admitem que a falha anunciada na sexta-feira atingiu em cheio a reputação do banco de investimento do UBS. Apesar das explicações, operadores do mercado perguntam como foi possível um trader esconder, dos controles internos do banco, derivativos fajutos no mercado de fundos.

O CEO do UBS, Oswald J. Grübel, tentou levantar o moral dos empregados do banco, no domingo, dizendo, em memorando interno, entender porque muitos estavam “chocados e desapontados”, mas que deveriam estar orgulhosos de seu forte relacionamento com os clientes. Para o CEO, “o incidente foi perpetrado por um negociador sem escrúpulos” e admite que o gerenciamento correto do fato seria “fazer tudo para determinar como isto aconteceu e o que nós precisamos fazer para assegurar que isto não mais ocorra”.

Enquanto o CEO sofre pressão de advogados e do mercado para renunciar, em função da falha, é bom lembrar que perdas financeiras, oriundas ou não de fraudes, figuram no topo das listas das crises das corporações, principalmente da área de finanças. No caso do UBS, além do momento difícil, fruto da conjuntura do sistema financeiro da zona do euro, ele figurava entre os bancos europeus que estavam recuperando a credibilidade. Por isso a dificuldade do mercado para entender tamanho cochilo.

Segundo os especialistas, “os bancos tiveram importantes lições nesse período de crise, mas devem repensar seus incentivos à busca de ganhos e desconfiar de seus próprios números”. Para John Feely, sócio e líder global de auditoria interna da PriceWaterhouseCoopers (PWC), nos próximos meses, a fraude de US$ 2,3 bilhões do banco suíço UBS será um assunto desconfortavelmente obrigatório nas reuniões de comitês de auditoria e conselhos de bancos de investimentos em todo o mundo. “Não tenho dúvidas de que será sempre o primeiro tema da mesa”, diz o executivo.

Salvatore Cantale, professor de finanças do instituto de estudos de negócios suiço IMD Business School é mais duro na avaliação do que aconteceu no UBS: “Mas eles não aprenderam nada com a crise de 2008?” Segundo o professor, muitas lições foram aprendidas, e os bancos evoluíram na supervisão de suas operações, mas é preciso mudar o modelo de trabalho e incentivos dos bancos de investimento.

É bom lembrar que o banco suíço teve prejuízos bilionários em 2008, advindos de créditos imobiliários podres. Foi um dos bancos europeus que mais perderam naquele período.

“Três anos se passaram desde a quebra do Lehman e o início da crise financeira. Os bancos aprenderam lições importantes, mas a real causa da crise – o desalinhamento entre incentivos e criação de valor – continua aí”, diz o professor. Deduz-se do episódio do UBS falhas graves na gestão de crises. Seria possível prevenir a falha se o UBS tivesse tomado os cuidados de compliance e de controles internos determinados para os bancos, principalmente a partir da crise de 2008. Por isso, o episódio é grande motivo de constrangimento para uma instituição ainda empenhada em reconquistar a confiança do cliente, após o quase colapso em 2008, no auge da crise financeira.

Ainda segundo John Feely, há muito trabalho a ser feito e o trabalho de auditores internos precisa ser mais efetivo. “Os auditores precisam questionar mais e pensar mais nos riscos futuros. As evidências mostram que o trabalho não está sendo como deveria,” conclui o diretor da PwC.

Itaú e o estranho roubo dos cofres de aluguel

O roubo do conteúdo de 138 cofres de aluguel do banco Itaú, na Avenida Paulista (dos 2,5 mil existentes) , em 27 de agosto, deve ser incluído no rol dos roubos cinematográficos a bancos do país. Estima-se em R$ 100 milhões a quantia levada em dinheiro, joias e pedras preciosas dos clientes que alugavam cofres na agência do Itaú. Talvez nunca se saberá o valor real.

Roubo de cofres é dos piores passivos relacionados a assaltos de um banco. Cofres de aluguel, como se sabe, escondem bens e fortunas que os proprietários não gostam de guardar em casa e, muitas vezes, preferem manter em segredo. A maioria não declarados à Receita e ignorados até pela família. Poucos clientes vieram a público informar à imprensa o próprio prejuízo, talvez na esperança de que alguém visse as jóias ou trouxesse alguma suspeita sobre o roubo.

Mas o que também agravou essa crise do Itaú foi a forma como a polícia entrou no negócio. O sistema de alarme foi desligado, levando a polícia a suspeitar de um empregado da empresa de segurança, sumido desde o dia 27. Os ladrões tiveram muita tranquilidade para praticar o assalto. Ficaram dez horas na agência. Eles saíram pela porta da frente do banco, de dia, na Avenida Paulista, onde os comparsas os esperavam. Deram-se ao luxo até de comprar lanches durante o assalto.

Grave. As vítimas só foram saber do assalto na quarta-feira, dia 31. Isso porque um cliente descobriu e contou para outros. O Itaú não havia se manifestado oficialmente e até agora o site da empresa não traz qualquer nota sobre o assalto. Ou seja, do ponto de vista da comunicação para o Itaú o assalto não aconteceu. Ao não se posicionar, o Itaú deixou que a mídia e a polícia conduzissem a crise.

E a investigação? Após cinco dias, a polícia encaminhou o caso ao Deic (Departamento de Polícia Especializada em roubo a bancos). Só após nove dias a polícia foi ao local do crime fazer perícia. Muitas pistas nesse período já haviam sido tiradas ou limpas. Poucos clientes registraram ocorrência, o que dificulta o trabalho da polícia, que não sabe o que procurar. Talvez os clientes não queiram aparecer por medo de serem extorquidos pelos ladrões.

Apareceu também nesse imbróglio rocambolesco um delegado que estava fazendo investigação paralela, à revelia do Deic. O delegado Ruy Ferraz Fontes, abriu um inquérito e recebeu do banco cópias das imagens do crime antes do Departamento de Investigações sobre o Crime Organizado (Deic). Ele já foi afastado, até porque descobriu-se uma preferência do Itaú, em ocorrências passadas, por esse delegado.

Os clientes mais prejudicados e que não têm medo de aparecer contrataram a RCI First Security and Intelligence Advising, dos Estados Unidos, para rastrear casas de jóias, lapidadores e outras pessoas que pudessem estar negociando os valores. A cúpula da Segurança Pública só soube da magnitude do roubo oito dias depois.

Ou seja, não bastasse o assalto a cofres de aluguel já representar grande desgaste para um banco, quando o fato começa a ter contornos à La Sherlock Holmes, as coisas pioram. No fim de semana, a polícia anunciou a prisão de um pedreiro, encontrado gastando libras e dólares. Pode ser que a polícia paulista tenha sorte e encontre a quadrilha e recupere pelo menos parte do produtos roubados. Mas esse episódio deixa algumas lições para empresas que costumam desdenhar da capacidade das quadrilhas: para um banco que se diz “tecnológico”, falhas incríveis de segurança e uma série de trapalhadas dão ao assalto ao banco Itaú uma cara de operação Tabajara.

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Fotos: AFP e Getty Images

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