enchentes na Asia 20172017 acabou. E não deixa saudades. Começou com um  primeiro choque, simbolizado na posse do presidente mais controverso da história americana. O mundo enfrentou uma onda de atentados, sem preferência pelos alvos, dos países desenvolvidos aos mais atrasados. Da Europa à África. Desastres naturais cada vez mais intensos e caros; crises políticas, como na Turquia, Venezuela e Espanha; e a triste saga da migração de refugiados. Foram as áreas onde sobressaíram as crises do mundo no ano que passou.

Se a campanha eleitoral dos EUA já tinha sido de baixo nível, o que não poderia acontecer quando o improvável vencedor assumisse a presidência? Não demorou e Donald Trump mostrou a que veio. Ele é a crise em pessoa. Além de atropelar vários programas sociais de Obama, com teses bastante controversas, como o plano de saúde, restrição a imigrantes e combate à poluição, ele só abre a boca pelo Twitter para se vangloriar e atacar adversários políticos. Não apenas as palavras são de péssimo gosto, instiladas pela ironia e o deboche, como a linguagem corporal do presidente também é bastante provocativa. Da equipe mais próxima, pelo menos 13 pessoas já caíram, por estarem enrolados em alguma denúncia, por iniciativa própria, ou por desagradarem o “big boss”. É um governo que vive perigosamente no limiar da crise. Por isso, após um ano registra o menor índice de aprovação, na história política dos EUA.   

Mas o que marcou 2017, quando se olha para o “mapa da crise” foram os inúmeros atentados ocorridos no mundo. Não se respeitou nem países desenvolvidos, nem os que enfrentam conflitos há anos. Da Síria aos Estados Unidos, da Suécia ao Iraque, foi o ano dos atentados letais, ocorridos por motivos fúteis; em alguns casos, são fanáticos – lobos solitários – que se radicalizaram ou querem vingança por algum motivo; ou, na maioria das vezes, estimulado pelo famigerado e escurraçado grupo extremista Estado islâmico (Isis).

Furacões arrasam o Caribe

Foi o ano dos furacões violentos. Pelo menos três por onde passaram deixaram destruição e morte. Os furacões Irma (o maior furacão do Atlântico em 2017), Katia, José e Harvey (este o mais destruidor, que atingiu os EUA três vezes, com ventos de até 200km/h) causaram mais de 100 mortes; desabrigaram mais de 50 mil pessoas e provocaram prejuízos calculados em mais de US$ 150 bilhões na América do Norte e Central. Milhares de pessoas precisaram se deslocar para abrigos. O ano de 2017 foi o que gerou mais prejuízo por desastres naturais nos últimos seis anos. Calcula-se que foi de US$ 306 bilhões o prejuízo nos vários desastres naturais ocorridos pelo mundo. Só superado em 2011, quando aconteceu a tríplice tragédia do Japão.

Já que falamos de fenômenos climáticos, inundações em Houston, no Texas, e incêndios na Califórnia marcaram um ano muito difícil para os Estados Unidos. Em Houston as autoridades apelaram até para os proprietários de barcos, para ajudar no resgate dos vizinhos. Cuba, Porto Rico, Ilha de San Martin (nesta 70% das residências foram destruídas) e proximidades também foram duramente afetados pelos furacões. Várias pequenas ilhas do Caribe foram literalmente arrasadas pela fúria dos ventos.

Os terremotos também marcaram o ano. No México, o mais violento desde 1985, quando então morreram mais de 10 mil pessoas. Mais preparado, o país enfrentou esse novo abalo com mais segurança. Mesmo assim, pelo menos 250 mortos. Após uma avalanche, terremoto atingiu hotel nos Alpes italianos, matando seis pessoas. No Irã e no Iraque, terremoto de 7.3 na escala Richter matou pelo menos 530 pessoas e feriu 8 mil, em novembro.

Outro desastre natural cada vez mais letal, que marcou o ano, foram os incêndios, tanto nos EUA, quanto na Europa. Na Califórnia, eles destruíram centenas de casas, muitas mansões de celebridades, agravados pelo vento dessa época do ano. Na Europa, principalmente em Portugal e na França, os incêndios causaram dezenas de mortes. Em Portugal, o fogo destruiu 440 mil hectares de florestas, uma área devastada 400 vezes maior do que a média de anos anteriores. Mais de 100 pessoas morreram, por ficarem ilhadas pelo fogo. A violência e rapidez dos incêndios deixaram dezenas de pessoas presas no meio das labaredas e centenas ficaram feridas.

As chuvas de agosto e setembro provocaram várias inundações na Ásia, principalmente no Nepal, na Índia e em Bangladesh, com cerca de 120 mortes. Mais de 41 milhões de pessoas foram afetadas; centenas de milhares perderam suas casas, plantações e meios de subsistência. Peru, Haiti, Japão, Paraguai e Serra Leoa (onde morreram 400 pessoas) também foram países que sofreram com as enchentes em 2017. China, Brasil e Uruguai também enfrentaram inundações durante 2017.

Atentados provocam crises improváveis

atentado las vegas out 2017Se em 2015 foi Paris, em 2016 aconteceu em Nice. Um fanático avançou com um caminhão por uma avenida, durante as comemorações do 14 de julho, atropelando e matando 84 pessoas e deixando centenas de feridos. Ele inaugurou uma nova forma macabra de ataque terrorista, imitado em vários lugares. O aeroporto de Bruxelas também sofreu um ataque naquele ano, deixando 13 mortos. E perto do Natal de 2016, Berlim também foi vítima, quando um caminhão invadiu uma feira de Natal, atropelou várias pessoas e matou 13. Em junho de 2016, foi a vez dos Estados Unidos: atentado a tiros em uma boate gay da Flórida ceifou a vida de 53 pessoas. Essa triste rotina que começou na França, passou pela Bélgica, EUA e países da Ásia e da África, em 2017 assumiu ares de tragédia global. A ponto de não se garantir segurança em nenhum lugar, em nenhum transporte. O terrorista pode estar dentro de um veículo, no metrô ou no avião, quanto numa tocaia, munido de um fuzil automático.

Em março de 2017, no Reino Unido um fanático atropelou várias pessoas na Ponte de Westminster, no coração de Londres, perto do famoso Big Ben e do Parlamento britânico. Outro atirador, em Manchester, no norte da Inglaterra, aproveitou um show de uma cantora para abrir fogo na saída dos assistentes. Resultado: 23 mortos, a maioria adolescentes, e 120 feridos.  E em maio, outro fanático atropelou várias pessoas na Ponte de Londres: oito mortos e 48 feridos. Um atentado que chamou muita atenção em 2017 ocorreu nas famosas “ramblas” (rua de pedestres repletas de restaurantes e todo tipo de comércio) de Barcelona, Espanha. Uma van avançou pelas “ramblas”, um dos lugares mais populares da Europa, e deixou 16 mortos (de várias nacionalidades), ferindo mais de 100 pessoas.

O ano mais mortal em atentados a bala nos EUA

2017 foi o ano mais mortal em atentados a bala nos Estados Unidos, sendo um dos mais letais o da Igreja Batista em Sutherland Springs, pequena cidade do Texas (EUA), quando morreram 27 pessoas, sendo 14 crianças. E o mais violento, o atentado contra uma multidão num festival de música em Las Vegas: 59 mortos e cerca de 600 feridos. Este foi o pior atentado com tiros da história dos EUA. Em outubro, outro atentado, um fanático matou oito pessoas perto do monumento do World Trade Center, cinco eram turistas argentinos.

O problema do país é a rotina sangrenta que ocorre quase diariamente contra pessoas inocentes, principalmente adolescentes e crianças. Isso tem acirrado a discussão sobre restrições à compra de armas, alimentada pela polêmica do presidente Trump de ter sido apoiado pela famigerada National Rifle Association (NRA), a organização que prega a liberdade total de venda de armas no país e despeja recursos em campanhas políticas. O laboratório que monitora todos os atentados com arma de fogo no país constatou que os EUA ja tinham sofrido 338 atentados, até dezembro (média de quase um atentado por dia), com 588 mortos (critério para considerar atentado a tiros é contabilizar 4 ou mais assassinatos por evento), um recorde absoluto.

A África também tem sido vítima de ataques terroristas quase todos os meses de 2017. O mais violento ocorreu em outubro, matando 302 pessoas na Somália. Este país sofre com o desgoverno e o caos administrativo, há vários anos. Essa rotina de atentados está presente em outros países da África, como Nigéria, Quênia, Líbia e outros. A África faz parte do corredor dos atentados, porque ali se digladiam diversos grupos extremistas, de várias tendências. Também foram vítimas de atentados a cidade de San Petersburgo, na Rússia, com 16 mortos e dezenas de feridos; em abril, foi a vez da Suécia, tradicionalmente um país pacífico e não atingido pela onda de violência. Atentado numa rua, feito por um atropelador, deixou cinco mortos e 15 feridos.

A crise dos refugiados

refugiados rohingya esperam ajudaSe durante o ano, apareceu menos a avalanche de refugiados em direção à Itália, via Mediterrâneo, isso não aconteceu em outras regiões. No caso do Mediterrâneo, medidas de contenção no litoral africano inibiram os traficantes de refugiados. A ONU continua monitorando a onda de migração por perseguições políticas ou religiosas, guerras ou doenças.

O que marcou o ano de 2017 foi a fuga da minoria Rohingya, um grupo de origem muçulmana, que vive em Mianmar, antiga Birmânia. Eles sempre foram perseguidos. Mas em 2017 parece que o espírito da intolerância e violência ultrapassou todos os limites. O que choca, é ser um país governado por uma mulher, Prêmio Nobel da Paz, exatamente por ter sido perseguida. O mundo todo se comoveu com milhares de famílias Rohingya famintas, doentes, fugindo para Bangladesh, outro país pobre e sem as mínimas condições de abrigá-los. Cerca de 600 mil pessoas foram deslocadas. A ONU teve muito cuidado em rotular essa perseguição. Mas após a morte de dezenas de pessoas em Mianmar, além da destruição de suas casas e da perseguição, não há como classificar essa diáspora, a não ser como um genocídio.

Venezuela é um caso perdido

Venezuela violenciaNa América do Sul, a Venezuela é um país em permanente crise. Crise política, econômica e ética. O governo ditatorial do despreparado Nicolás Maduro, herdeiro de Chávez, não sabe o que fazer para se perpetuar no poder. Já deu todo tipo de golpe, do fechamento do Parlamento a eleições fraudadas; manipula o Judiciário, demitindo juízes que se opõem às suas pretensões. A situação econômica é caótica, com inflação anual de 2.000%. Tudo pode acontecer naquele país, onde a população passa fome, sofre com a falta de assistência de saúde; e acaba fugindo para o Brasil. Mais de 30 mil venezuelanos buscaram abrigo em Roraima, em 2017.

Na Argentina, o novo governo, que está tentando resolver as crises herdadas dos anos Kirchner, no fim de 2017 precisou administrar uma tragédia, com o desaparecimento do submarino Ara San Juan, com 44 marinheiros a bordo. Até hoje o submarino não foi achado. Por trás do acidente, falha de gestão de riscos. As autoridades da marinha levaram vários dias enganando os parentes, quando sabiam ter havido uma explosão a bordo que praticamente inviabilizou a embarcação de emergir. Era um submarino antigo e que já havia passado por reformas.  

Em Londres, uma das tragédias que marcou o ano de 2017 foi o incêndio no edifício residencial Grenfell Tower, que deixou 71 mortos e 70 feridos. Foi o maior incêndio na capital britânica, em séculos, fora o tempo da guerra. Investigação constatou que o material usado numa reforma feita nesse edifício há seis anos era proibido e impróprio para edifícios residenciais. Porque é inflamável. Além disso, o alarme de incêndio também falhou. Pior, existem pelo menos 600 habitações populares em Londres com o mesmo material. E uma grande investigação resultou dessa tragédia. Por se tratar de moradia de classes mais pobres, o incêndio gerou um grande debate político. Nem países desenvolvidos e com bastante experiência em gerenciamento de risco são capazes de evitar uma tragédia que, certamente, ocorreu por uma sucessão de falhas.

Crises políticas

2017 vai ser lembrado também como o ano em que a direita cresceu, principalmente na Europa e nos Estados Unidos. A vitória de Trump, poderíamos chamar um ponto fora da curva. Certamente, muitos que votaram nele pensando numa “América grande”, se arrependeram, porque as decisões tomadas pelo empresário, sem nenhuma experiência política, acabaram indo contra o bom senso. Uma delas o rompimento com o Acordo do clima de Paris. Na Europa, a Áustria elegeu um governo de direita, literalmente contra acolher refugiados, tendência que também aumentou o número de deputados no parlamento alemão. Na Espanha, o primeiro ministro enfrenta crise grave desde novembro, quando dissidentes da Catalunha resolveram liderar um movimento de separação. O premier espanhol resolveu peitar os separatistas, sendo que o líder está isolado na Bélgica. Se voltar, será preso.

A seca e a fome

africa secaA África continua sendo um Continente que vive em crise. O que mais preocupou a ONU foi o Sudão do Sul, uma das mais novas repúblicas do mundo. A fome foi um flagelo no país, devastado por guerras e disputas tribais. A ONU considerou essa crise alimentar a pior desde 2011, na África. Mas não foi só o Sudão do Sul. Todo o leste da África, assolado por uma seca que se arrasta há anos, e por conflitos, deixou 22 milhões de pessoas à beira de uma catástrofe humanitária. Não há alimentos suficientes.

Essa população, entre as mais pobres do mundo, inclui Somália, Quênia, Djibouti, Etiópia e Uganda. Em algumas regiões é a pior seca em 60 anos, o que inviabilizou plantações e a criação de animais. A violência também atinge países como Nigéria, Camarões, Chade e Níger, onde as disputas tribais matam e escravizam as populações. O clima da África de estiagem crônica se assemelha muito ao que acontece no Nordeste brasileiro. Mas seca e fome não é uma crise só na África. No Yemen, no sudoeste da Península da Arábia, assolado há dois anos por conflitos e atentados violentos, calcula-se que 14 milhões de pessoas estejam passando fome. 70% da população passa algum tipo de necessidade.

Outra crise que insiste em não acabar é a relação de gato e rato entre Donald Trump e o herdeiro da ditadura norte coreana, Kim Jong-un, que fica brincando de estadista, lançando mísseis em direção ao Japão e outros países, como se tivesse cacife para ameaçar alguma potência internacional. Apesar de todas as advertências, inclusive da China, Coreia do Sul e do Japão, Trump parece gostar dessa disputa, na falta do que fazer. Foi por líderes despreparados, como esses, que o mundo já se envolveu em dois conflitos mundiais, que mataram milhões de pessoas.

Para finalizar, poderíamos dizer também que 2017 foi o ano da transparência do assédio. Várias celebridades de Hollywood, maioria mulheres, denunciaram ex-colegas ou chefes por assédio sexual. Foi o estopim da crise de reputação que atingiu muitas celebridades. A onda de denúncias ceifou muitas cabeças coroadas de Hollywood, da política e da mídia internacional, como os diretors de cinema Harvey Weinstein e James Toback, além do ator Kevin Spacey e parlamentares americanos. Algumas histórias remontam há 20 anos, mas só agora vieram à tona. Jornalistas famosos da TV também entraram nessas malfadada lista. Foi a primeira vez que denúncias em série atingem tantas celebridades da imprensa e do cinema nos Estados Unidos. Foi assim que 2017 acabou. Se a crise econômica deu uma certa trégua à Europa e Estados Unidos, o terror e os conflitos políticos não permitiram que se respirasse com tranquilidade durante o ano. Para não dizer que tudo foi ruim, acaba de sair relatório que aponta o ano passado como o mais seguro do transporte aéreo nos últimos anos, sem registro de acidente grave na aviação comercial. Aleluia! Pelo menos isso.

Fotos: Getty Images: atentado em Las Vegas (EUA); Aminul Sawon/IFRC ASIA PACIFIC Enchente em Bangladesh; Hussam Al-Shormani/ICRC - Refugiados esperando a cota diária de pão, num abrigo no Yemen; Arie Kievit/Cruz Veremelha holandesa. Seca na África.

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