crise brasileiraO jornalista e escritor Zuenir Ventura, em entrevista à rádio CBN, resumiu bem o que foi 2016: “O ano das crises”. Nem durante o período da ditadura militar, disse ele, ou nas tentativas de golpe ou golpe contra Getúlio, Juscelino, Jango, ou na renúncia de Jânio, o Brasil viveu um ano tão instável e carregado de crises como 2016. Se no passado as crises eram graves, tínhamos pelo menos um horizonte, havia uma grande esperança de que aquilo iria ter uma solução. Hoje não, admite Zuenir.

Difícil dizer qual foi a crise mais grave, ou onde não há crise neste ano da graça de 2016. No Brasil, não há dúvidas de que o impeachment da ex-presidente Dilma Roussef foi o fato mais marcante e traumático do ano. Porque o afastamento de um presidente eleito é sempre uma crise grave, independentemente dos fatos que levaram ao processo de afastamento ou do que acontece depois. É uma ruptura, embora constitucional, de um processo político e sempre deixa sequelas. Combinado com a pior crise econômica da nossa história moderna e a crise ética do estamento político, temos o pior dos mundos.

Se fôssemos escolher as palavras-chave da crise brasileira no ano que passou, certamente passaria por impeachment, corrupção, zika vírus, Lava Jato, violência do trânsito, Chapecoense, falência do Rio de Janeiro, seca no Nordeste, caos da saúde; caos na educação; ocupação de colégios e universidades; políticos denunciados, entre tantas outras.

No mundo, as palavras da crise poderiam ser Brexit, terrorismo, atentados, refugiados, Trump, Síria, Isis, drama da África, Panama Papers, terremotos na Itália, Haiti e Equador, Acordo de Paz com as Farc, derretimento da Venezuela.

Panama Papers” foi como se batizou a publicação de 11,5 milhões de documentos confidenciais de uma empresa offshore chamada Mossack Fonseca que expôs atividades ilegais de milhares de pessoas, como fraude, cleptocracia, evasão de divisas e violação de sanções internacionais. Os crimes foram cometidos pela elite de vários países, inclusive no Brasil, envolvendo políticos e empresários, com o beneplácito de bancos, entre eles o HSBC, banco britânico que fechou as atividades no Brasil, em 2016.

Acidentes

Embora não tenha ocorrido nenhum acidente com aviões de grande porte, como em anos anteriores, foi também um ano com várias centenas de mortos em tragédias envolvendo aviões de médio e pequeno porte, como na queda do Airbus da EgyptAir MS804, em maio, que matou 66 pessoas; do Tupolev russo, conduzindo militares para a Síria, que caiu em 25 de dezembro, fazendo 92 vítimas fatais, a maioria militares. E o mais impactante para o Brasil, o voo da empresa pirata LaMia, que matou 71 pessoas, entre atletas e dirigentes da equipe da Chapecoense, além de jornalistas e convidados. Houve também muitos acidentes com empresas regionais, em aviões de pequeno porte e com helicópteros. Mas quem pensa nos aviões como meio de transporte perigoso, precisa conferir as trágicas estatísticas de acidentes de trem e ônibus pelo mundo. Na índia, 2016 foi um ano de tragédias nos sucateados trens e ferrovias do país, com centenas de mortes. O último ocorreu em novembro, matando 150 pessoas.  

Olimpíadas, Lava Jato e Zika Vírus

brasil criseO Brasil projetou-se em 2016 como um país mergulhado numa crise política, econômica e ética sem precedentes na história. Mas que se levantou das cinzas e conseguiu dar um suspiro, ao promover os Jogos Olímpicos que mereceram aplausos e admiração em todo o mundo. Muito poucos erros e sucesso de público e de competições. A tragédia das Olimpíadas, a exemplo da Grécia, chegou depois. O Rio de Janeiro literalmente quebrou, não tem recursos sequer para pagar os salários dos aposentados. E o Brasil continua mergulhado numa crise econômica que teima em não arrefecer. Não se sabe ao certo quanto o Brasil gastou nessa "festa" com o dinheiro público, mas atualizado pode ser algo em torno de R$ 37 bilhões. Um dia esse desvairio de Lula e cia será exposto em toda a sua crueza.

Entretanto, apesar do oba-oba em torno das Olimpíadas, o país foi para as manchetes internacionais muito mais pelas notícias negativas. Caos político, um dos piores desempenhos na economia no mundo, como também pelo Zika Vírus e seus primos Chinkungunya e Dengue, que contaminaram milhares de brasileiros e centenas de mulheres grávidas. Para estas, o efeito foi mais devastador. O Brasil foi o primeiro país a descobrir e alertar a ligação do Zika vírus com centenas de nascimento de bebês com microcefalia, o que se transformou num problema de saúde pública interno e assustou o mundo pelo poder de disseminação.

O ano de 2016 também recebeu de herança a grave crise política iniciada em 2015, quando a presidente Dilma, por erros cometidos no primeiro ano do 2º mandato, arrastou multidões às ruas, pedindo mudanças e o impeachment. Essa crise do País se agravou na medida em que o processo de impedimento avançou e pelo aprofundamento das investigações da Operação Lava Jato da PF, envolvendo grande parte das lideranças política atuais. A falta de um líder político de relevância, que aglutinasse o movimento de recuperação econômica e ético do País também contribuiu para a falta de um horizonte durante esse período. O país chegou ao ponto de ter dois políticos na linha sucessória do presidente que assumiu, após o impeachment, barrados pela Justiça. As pessoas, tanto no governo, quanto em grandes empresas, passaram a ser a própria crise. O presidente que assumiu em poucos meses teve que demitir vários ministros para conter a crise, por terem sido atingidos pelos estilhaços da Lava Jato. Talvez a grande crise que hoje enfrentamos seja a falta de um norte, de um horizonte que aponte caminhos menos turbados.

A Operação Lava Jato continuou na sua trajetória de terra arrasada contra os políticos, operadores, comunicadores e empresários. A delação da construtora Odebrecht, como de outras empreiteiras, criou um clima de pavor em Brasília. Embora não homologada, os vazamentos já antecipam muito do que vai acontecer. Cada revelação do esquema montado pela Odebrecht para administrar uma verdadeira "escola da propina" no Brasil e no exterior não deixa dúvidas de que vivemos um período muito próximo das práticas da "cosa nostra". O prejuízo ao país e ao povo brasileiro, que sofre com a falta de transporte, saúde, educação e segurança minimamente aceitáveis, com essas práticas que desviaram bilhões de dólares, é incalculável. Difícil dizer se essas empresas estão aprendendo com a crise para reconhecerem o erro e se redimirem. O Brasil não tem essa tradição. Essa talvez a pior crise do país hoje.

O Brasil sediou os Jogos Olímpicos, o que serviu para anestesiar o país durante mais de 30 dias, quando se expôs ao mundo numa audiência de bilhões de espectadores. Mas, passada as Olimpíadas, o país e a opinião pública mundial caíram na real. O desemprego não esmorece; as empresas estão paradas, por falta de encomenda, e o serviço público entrou em pane pelo menos nos estados do Rio de Janeiro, Rio G. do Sul e Minas Gerais.

O pior de tudo isso é que ante o aceno de cortes, as classes mais privilegiadas e com voz mais ativa, capitaneados pelo Congresso, reagem e prometem incendiar o País. Ninguém quer corte de privilégios. Mas querem uma solução para a crise. O que é um paradoxo. Não há como sair da crise sem sacrifício de todos e o governo precisa ter a coragem, ainda que sofra um desgaste muito grande, de cortar na carne, principalmente dos setores mais bem favorecidos. E deveria começar pelos que ganham mais. Mas quando sabemos que no Judiciário, apenas para citar uma área e um poder, juízes, desembargadores, ministros, membros de tribunais faturam mensalmente (incluídos os penduricalhos e indenizações) verdadeiras fortunas que se aproximam dos R$ 100 mil, ultrapassando o teto constitucional, compreende-se por que não sairemos dessa crise tão cedo. Infelizmente, o País tem uma casta no Executivo, Legislativo e Judiciário que só olha para o umbigo, ciosa dos privilégios e vantagens, e alheia ao que acontece para o restante dos 99% dos brasileiros.

No exterior, o ano do terremoto político

refugiados desesperoNão há dúvida. O que caiu no descrédito em 2016 foram as pesquisas de voto. Erraram feio no plebiscito do Brexit, no Reino Unido. E pior ainda na eleição para presidente dos EUA. Cravaram que o “remain” venceria e Cameron relaxou nos minutos finais da partida. Resultado: por pequena maioria, a população do Reino Unido optou por sair da União Europeia, levando à renúncia do premier britânico David Cameron. Essa crise ainda não foi deglutida. Ficou para 2017.

“Do Brexit a Donald Trump, da crise dos refugiados à guerra na Síria até a contínua catástrofe de mudança do clima – 2016 foi realmente um ano difícil”. (The Guardian).

A eleição de Donald Trump foi o maior tombo da mídia e das pesquisas eleitorais dos últimos anos. Elas não conseguiram detectar um movimento que vinha crescendo no interior, com população branca, conservadora e insatisfeita com os rumos dos EUA. Nem Trump talvez imaginasse uma vitória na dimensão como aconteceu. Uma decepção para os liberais e para a paz e a conciliação mundial. Com Trump, assume a presidência o que há de mais conservador e retrógrado na agenda de avanços da sociedade americana. Muito do que foi construído por Obama vai ser pelo menos questionado, quando não revogado.

Na América Latina, além do Brasil a crise mais grave ocorre na Venezuela. O país está derretendo por conta de uma ditadura atrasada, da herança maldita de Chávez e a ignorância política do grupo que está no poder. O país rico em petróleo está condenando sua população à miséria e à ignorância, onde falta comida, artigos de primeira necessidade e o serviço público é caótico.

A crise mundial dos refugiados piorou. Continua sendo a maior migração desde a II Guerra Mundial. Fugas suicidas da África e da Ásia continuam pelo Mediterrâneo ou por outras rotas nas montanhas em direção à Europa. Até outubro, pelo menos 4.220 pessoas morreram tentando cruzar o Mediterrâneo em busca do sonho europeu. Um recorde. 70% deles sofreram tráfico humano, de órgãos e até de sangue. Num único país, a Síria, em guerra civil há 5 anos, 12,5 milhões de pessoas estão fora de suas casas, no país ou no exterior.

Mas o terrorismo continua a assombrar o mundo como a maior ameaça à segurança e à paz entre as nações. França, Bélgica, Alemanha, Rússia, Turquia, Iraque, Síria, Paquistão, Afeganistão, Estados Unidos, índia e vários países da África sofreram atentados que deixaram centenas de mortos. A ameaça de radicais de várias correntes de terror criou um estado policial em vários países da Europa, a ponto de alimentar uma paranoia de segurança e desconfiança permanente. Isso favorece a xenofobia e a discriminação contra imigrantes, dificultando a sua recolocação e inserção na sociedade europeia.

Segundo o jornal britânico The Guardian, a Universidade de Maryland calcula que 10.537 pessoas foram mortas em 18.803 ataques terroristas relacionados entre 1970 e o fim de 2015. “Na Europa Ocidental, os incidentes terroristas foram mais comuns há 40 anos. Mas em um mundo de mídias sociais, o pânico e o susto se espalham mais rapidamente, com velocidade acelerada pela estúpida brutalidade do estado islâmico.”

Se a paz continua sendo o objeto do desejo de todo o mundo, 2016 não deixou saudades e muito menos esperança de que essa meta seja alcançada a curto prazo em 2017.

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